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sábado, 25 de março de 2023

CONFISSÕES DE VOLTAIRE - UM MATERIALISTA DE VOLTA AO MUNDO ESPIRITUAL

François-Marie Arouet, conhecido como Voltaire, foi um escritor, historiador e filósofo iluminista francês que viveu no século 18 entre os anos 1694/1778 e ficou conhecido pelo pseudônimo M. de Voltaire. Aliás, codinome que adotou quando esteve preso na bastilha.

Voltaire era um cético inspirado pela ideia racional, herdada da Filosofia Renascentista, que elaborou uma teoria para refutar as tradições, tão preciosas para a religião e para a nobreza. Com isso, surgiu o argumento da certeza ser absurda.

Famoso por suas críticas sagazes ao cristianismo — especialmente à Igreja Católica Romana — e à escravidão, foi defensor da liberdade de expressãoliberdade de religião e a separação entre igreja e estado.

Seu modo de pensar pode ser descrito na frase de Evelyn Beatrice Hall"Posso não concordar com nenhuma palavra do que você disse, mas defenderei até a morte o seu direito de dizê-lo". Além disso, ele preconizava que cada um deveria pensar por si mesmo, desafiando os dogmas da igreja e da monarquia, estabelecendo que a certeza absoluta poderia até existir, mas era impossível de prová-la, sendo a dúvida o único ponto de vista lógico.

Ainda hoje, muitos se deixam arrebatar pelos escritos de Voltaire. No entanto, esse filósofo era um niilista. Um homem dotado de um grande gênio, ao qual a mediocridade era impossível. Como ser humano aspirava a liberdade, própria da sua essência. Ao chegar no mundo espiritual reencontrou tal liberdade, mas perdeu-se, confundiu-se.

O grande pregador do nada, o nada encontrou; mas, nada como compreendia. Se julgou tão grande, mas foi fulminado por sua pequenez, aniquilado diante de Deus, o qual era obrigado a contemplar diante da imortalidade da alma. Não experimentou qualquer julgamento preconizado pelas religiões ancestrais: "nem levanta-te meu filho, nem vai-te daqui". É que Deus lê nos corações de modo diverso de nós; Ele encontra o bem onde não achamos senão o mal.

O velho Voltaire desapareceu; surge o novo com suas confissões. Convertido, glorifica a Deus, confunde e impressiona aqueles que hoje deixam-se arrebatar por seus escritos.

De uma bela comunicação, “[...] traduzida do inglês [e] extraída da obra do juiz Edmonds, publicada nos Estados Unidos[, tem] a forma de uma conversa entre Voltaire e Wolsey, o célebre cardeal inglês do tempo de Henrique VIII [onde] dois médiuns atuaram separadamente para a transmissão desse diálogo”, podemos extrair algumas passagens interessantes, as quais reproduziremos a seguir.

Antes, porém, recomenda-se que o leitor busque os fundamentos da Filosofia Espírita, especialmente as questões 275, 275.a, 276 e 277 de O Livro dos Espíritos, onde iremos aprender que poder e consideração na Terra não dá supremacia no mundo espiritual, onde vige a superioridade real, que é a elevação moral, porquanto, todo orgulhoso sentir-se-á humilhado.

Destarte, como se depreende da questão 267.a de O Livro dos Espíritos, há uma luta que a ALMA ENCARNADA ENFRENTA, onde a matéria exerce influência para fruir e gozar e satisfazer aos cinco sentidos, enquanto o Espírito não quer esse gozo, mas conhecer os problemas oriundos da satisfação dos desejos.

Finalmente, é importante lembrar que, segundo as questões 266 e 318 de O Livro dos Espíritos, de volta ao mundo espiritual, o Espírito experimenta modificações de suas ideias, pois, para o Espírito liberto da matéria, cessa a ilusão, e a sua maneira de pensar é diferente.

1. Uma alma sedente de luz:

"Pretendeis acusar-me de infidelidade porque não me submeti aos acanhados preconceitos das seitas que me cercavam? É que a minha alma demandava uma amplidão de pensamento, um raio de luz, além das doutrinas humanas. Sim, minha alma entenebrecida tinha sede de luz".

2. Um Espírito assediado por uma luta interior:

"Mas notai bem que então eu tinha o Espírito assediado, por assim dizer, por uma luta interior. Considerava a Humanidade como se me fosse inferior em inteligência e em sagacidade; nela somente via marionetes, que podiam ser conduzidos por qualquer homem dotado de vontade forte, e me indignava de ver essa Humanidade, arrogando-se uma existência imortal, ser modelada por elementos ignóbeis. Seria possível crer que um ser dessa espécie fizesse parte da Divindade e pudesse, com suas frágeis mãos, apoderar-se da imortalidade? Esta lacuna entre duas existências tão desproporcionadas me chocava e eu não a podia preencher. No homem eu via apenas o animal, e não Deus".

3. Um Espírito em evolução com seus acertos e erros:

"Reconheço, em alguns casos, que minhas opiniões tiveram deploráveis desdobramentos, mas estou convencido de que, sob outros aspectos, apresentaram o seu lado bom. Conseguiram soerguer várias almas que se haviam degradado na escravidão; quebraram as cadeias do pensamento e deram asas às grandes aspirações. Mas, lamentavelmente, também eu, que planava tão alto, me perdi como os outros".

4. O gênio desenvolveu apenas a inteligência:

"Se em mim a parte espiritual tivesse se desenvolvido tão bem quanto a parte material, teria podido raciocinar com mais discernimento. Entretanto, confundindo-as, perdi de vista esta imortalidade da alma, que tanto procurava e não pedia senão para encontrar".

5. O Espírito passa em revista sua anterior reencarnação e se frustra pelo que não realizou:

"Só lamento ter vivido tanto tempo na Terra sem saber o que teria podido ser e o que teria podido fazer. O que não teria feito se tivesse sido abençoado por essas luzes do Espiritismo que hoje se derramam sobre os Espíritos dos homens!"

6. A confissão de Voltaire - Deus e a Imortalidade da Alma:

"Descrente e vacilante entrei no mundo espírita. Por si só minha presença era suficiente para banir qualquer clarão de luz que pudesse iluminar a minha alma obscurecida; apenas a parte material de meu corpo se havia desenvolvido na Terra; quanto à parte espiritual, havia-se perdido em meio aos meus descaminhos, na busca da luz, ferro. Altivo e zombeteiro, ali me iniciava, não conhecendo nem procurando conhecer esse futuro que em vida tanto havia combatido. Mas façamos aqui esta confissão: houve sempre em minha alma uma débil voz que se fazia ouvir através dos grilhões materiais e que pedia luz. Era uma luta incessante entre o desejo de saber e uma obstinação em não saber. Assim, pois, minha entrada estava longe de ser agradável. Não acabava eu de descobrir a falsidade, o nada das opiniões que havia sustentado com todas as forças de minhas faculdades? Depois de tudo, o homem se reconhecia imortal, e eu não podia deixar de ver que, igualmente, deveria existir um Deus, um Espírito imortal, que estava à frente e que governava esse espaço ilimitado que me cercava".

7. Recusando a imortalidade em vida, não haverá ninguém para estabelecer relações na vida espírita:

"Não pude realizar-me como Espírito que acabava de deixar o seu domicílio mortal! Não houve ninguém com quem pudesse estabelecer relações, porque a todos eu havia recusado a imortalidade. Para mim não existia repouso: estava sempre errante e desconfiado. Em mim o Espírito, tenebroso e amargo, comportava-se como um maníaco, incapaz de ser detido ou de perseguir um objetivo".

8. Nenhum castigo eterno, nenhuma punição, nenhuma recompensa:

"Foi nesse momento que o meu coração começou a sentir a necessidade de expandir-se; uma associação qualquer se tornava urgente, porque me sentia queimar pelo desejo de confessar o quanto tinha sido induzido em erro, não pelos outros, mas por meus próprios sonhos. Já não me restavam ilusões sobre a minha importância pessoal, porque percebia a minha insignificância neste grande mundo dos Espíritos. Enfim, de tal forma me deixara cair na lassidão e na humilhação, que me foi permitido reunir-me a alguns habitantes. Só então pude contemplar a posição em que me havia colocado na Terra e o que disso resultava no mundo espírita. Julgai se esta apreciação poderia favorecer-me".

Estes fragmentos dessa bela mensagem, sem perquirir a identidade do comunicante, valida muito do que ainda temos a apreender estudando a Doutrina Espírita tal qual organizada por Allan Kardec, eis que cada um de nós, mais cedo ou mais tarde, irá cair na real. E essa realidade é o mundo espiritual.

Para mais informações e estudo dessa comunicação, remetemos o leitor à Revista Espírita de Setembro de 1859, com este belo artigo de Allan Kardec: Confissões de Voltaire.

Uberaba-MG, 25/03/2023
Beto Ramos.

quinta-feira, 26 de janeiro de 2023

EDUCAÇÃO E PROGRESSO MORAL SEGUNDO O ESPIRITISMO!


Fénelon, em O Livro dos Espíritos, responde a Allan Kardec sobre qual o meio de se destruir o egoísmo. Destaca na questão 917 que a dificuldade encontra-se na influência que a matéria exerce sobre os seres humanos, os quais, ainda muito próximos da sua origem, não podem se libertar.

Contudo, o que chama a atenção na resposta são os fatores que concorrem para entreter essa influência. Diz Fénelon: "suas leis, sua organização, sua educação.

O Espírito apresenta como meio eficaz de destruir o egoísmo compreender bem o Espiritismo e torná-lo o norte das crenças e dos costumes, isto é, transformar os hábitos, as tradições e práticas e as relações sociais.

Explicando melhor o papel da educação nesse processo, Allan Kardec, em nota à questão 917 de O Livro dos Espíritos, esclarece:

"A educação, se for bem compreendida, será a chave do progresso moral, quando se conhecer a arte de manejar a arte dos caracteres [caráter moral] como se conhece a de manejar as inteligências, poder-se-á endireitá-los, da mesma maneira como se endireitam as plantas novas. Essa arte, porém, requer muito tato, muita experiência e uma profunda observação. É um grave erro acreditar que basta ter a ciência para aplicá-la de maneira proveitosa". 

E neste sentido, somos de opinião que o trabalho do educador espírita não é o mesmo daquele sábio que instrui no campo da ciência. Veja que, respondendo a questão 617 de O Livro dos Espíritos, foi anunciado:

"[...] O sábio estuda as leis da matéria, o homem de bem as da alma, e as segue".

Além disto, encontramos na questão 383 da mesma obra citada que os Espíritos encarnam e passam pela infância "[...] com o fim de se aperfeiçoar", uma vez que "[...] o Espírito é mais acessível durante esse tempo às impressões que recebe e que podem ajudar o seu adiantamento, para o qual devem contribuir os que estão encarregados da sua educação".

Finalmente, em se tratando de ciência filosófico-espírita, assim se pronunciou José Herculano Pires em nota à própria Tradução de O Livro dos Espíritos, especialmente à questão 383, verbis:

"Os pais e os professores espíritas devem ponderar sobre este item e os que se lhe seguem. O Espiritismo vem abrir um novo capítulo da psicologia infantil e da pedagogia mostrando a importância da educação da criança não apenas para esta vida mas para a sua própria evolução espiritual".

Importa observar que Fénelon, Kardec e Herculano não tratam de evangelização em casa espírita ou no lar, mas, tratam objetivamente do processo complexo de EDUCAÇÃO MORAL DO ESPÍRITO com o fim de auxiliá-lo no processo evolutivo.

Deixe sua opinião e comentário. Você tem observado esse aspecto do Espiritismo e da sua utilidade para a humanidade?

Uberaba-MG, 26/01/2023
Beto Ramos

quinta-feira, 1 de dezembro de 2022

MOVIMENTO PLANETÁRIO PARA O PROGRESSO MORAL

 

Há sinais de que, na Terra, "tende a se estabelecer uma nova ordem de coisas, e os homens que são seus maiores opositores, sem saber, contribuem para isso"?

Podemos afirmar que está surgindo uma geração desembaraçada das escórias do velho mundo e que é formada de elementos mais depurados, animada de ideias e sentimentos diferentes dos que a geração presente demonstra?

Será que o velho mundo, logo, estará morto e viverá apenas na história, como ocorreu com os tempos da idade média, com seus costumes bárbaros e suas crenças supersticiosas?

Por incrível que pareça, todas as respostas a estas indagações são afirmativas. Encontramos essa bela dissertação na obra A Gênese, de Allan Kardec, 1868 (FEAL, 2018), no capítulo 18, Os Tempos São Chegados.

No final do item 7 o organizador do Espiritismo escreve:

"No entanto, todos sabem quanto deixa a desejar a atual ordem de coisas. Após, de certa forma, ter se esgotado o bem-estar material que a inteligência pode produzir, se compreenderá que o complemento desse bem-estar só pode estar no desenvolvimento moral. Quanto mais se avança, mais se sente o que falta, entretanto, sem poder ainda definir claramente: trata-se do trabalho íntimo que se opera pela regeneração. Tem-se desejos, aspirações que são como o pressentimento de um estado melhor".

Chama a atenção a observação de Allan Kardec quanto aos acontecimentos que permeiam esse processo:

"Contudo, uma troca tão radical como essa que se elabora não pode se cumprir sem comoção. Há uma inevitável luta entre as ideias. Desse conflito nascerão forçosamente perturbações temporárias até que o terreno esteja limpo e o equilíbrio, restabelecido. Assim, da luta de ideias surgirão os graves acontecimentos anunciados, e não de cataclismos ou catástrofes PURAMENTE materiais. Os cataclismos gerais eram as consequências do estado de formação da Terra, e atualmente não se agitam mais as entranhas do globo, mas as da humanidade".

Observando os acontecimentos dos dias atuais seria possível identificar movimentos, isto é, agitações da humanidade?

Em substancioso artigo, disponível na internet em A ATUAL CRISE DO CAPITALISMO, Reinaldo A. Carcanholo (professor do programa de pós-graduação em Política Social da Universidade Federal do Espírito Santo) afirma:

"A verdade é que vivemos em um regime que significa uma verdadeira tragédia para importante porção da humanidade, ao lado da pobreza para grande parte do restante. O período do colapso da atual etapa e o futuro do capitalismo só aumentarão a tragédia. Acreditar no retorno de um capitalismo capaz de crescimento sustentável e até de concessões aos trabalhadores é crer em ilusões; divulgar ideias nesse sentido é disseminar falsas esperanças. A perspectiva reformista produz um grande dano político. O capitalismo de amanhã só poderá ser pior do que o de hoje. Em nossos dias, para a humanidade, o capitalismo teoricamente está morto, é necessário matá-lo historicamente. E isso será muito difícil, mas não impossível."

Não estaríamos, segundo o estudo apresentado, diante do  que Kardec descreveu como o prelúdio do esgotamento do tal bem-estar material, que exige os esforços da humanidade para ser superado pelo desenvolvimento moral?

Responde-se positivamente a essa indagação. Contudo, é importante lembrar que o "progresso de cada parte do conjunto é relativo ao seu grau de adiantamento" (A Gênese, Allan Kardec, 1868 (FEAL, 2018), capítulo 18, item 9, Os Tempos São Chegados).

Há uma luta entre as ideias e isto se comprova por meio do estudo publicado na Revista Internacional Educon (ISSN 2675-672, vol. 2, n. 3, set/dez 2021), cujo título é "O Negacionismo: uma Crise Social da Relação com a “Verdade” na Sociedade Contemporânea", que esclarece:

"O que está em jogo no negacionismo e na crise da relação com a verdade, porém, não é apenas a ciência e seu ensino: é o espírito crítico, a liberdade de pensamento, a convivência democrática, a possibilidade de um mundo comum, compartilhado por pessoas diferentes. O que está em jogo, em todas as disciplinas da escola, e também na educação pelos pais e na forma como a sociedade trata os jovens, é a questão que Charlot levantou no seu livro Educação ou Barbárie? (Charlot, 2020). Formas antigas de barbárie estão voltando: nacionalismos agressivos, fundamentalismos religiosos excludentes, celebração das armas, da sobrevivência dos mais fortes e da morte dos mais fracos. Formas novas de barbárie estão invadindo o espaço público: cyberbullying, assédio e ódio nas redes sociais. O negacionismo é a forma epistemológica da barbárie contemporânea".

Todavia, apesar da luta de ideias nos dias atuais, Allan Kardec afirmou ainda no século 19 que "o progresso intelectual realizado até hoje, em grandes proporções, constitui um grande passo e marca a primeira fase da humanidade, mas sozinho é impotente para regenerá-la. Enquanto o homem estiver dominado pelo orgulho e egoísmo, utilizará sua inteligência e seus conhecimentos em proveito de suas paixões e de seus interesses pessoais" (Idem, item 16).

E não é exatamente o que se verifica no atual século 21? A bem dizer, o que se verifica não é o "aperfeiçoamento dos meios de prejudicar os outros e de destruição mútua" (ibidem)? Constata-se positivamente o vaticínio de Kardec.

Hoje, o negacionismo, como meio de prejudicar e destruir o próximo, distancia-se da crença estabelecida nas verdades eternas, que, não sujeitas à discussão, seriam aceitas por todos. O trabalho de esclarecimento, pois, está no início e exige o esforço de todos, uma vez que:

"Somente o progresso moral pode assegurar a felicidade dos homens sobre a Terra, colocando um freio às más paixões; só ele pode fazer reinar entre todos a concórdia, a paz, a fraternidade [...] Um tal estado de coisas supõe uma troca radical de sentimento das massas, um progresso geral que só poderia ocorrer saindo-se do círculo de ideias mesquinhas e triviais que alimentam o egoísmo".

A verdade é que ainda haverá choro e ranger de dentes. A batalha pela regeneração da humanidade coloca, lado-a-lado, os detentores das ideias progressivas e maduras e os refratários, que combatem as ideias novas como subversivas.

Nesse sensível movimento planetário para o progresso moral, é possível observar uma luta entre a geração de Espíritos refratários e a geração dos Espíritos que, mesmo não regenerados, amadureceram para as ideias de convivência fraterna, igualitária e solidária?

Responde aí nos comentários.


Uberaba-MG, 01/12/2022
Beto Ramos.

quinta-feira, 20 de outubro de 2022

ALLAN KARDEC, O PARTIDO CLERICAL E O ESPIRITISMO

O Brasil dos dias atuais enfrenta um dilema: personalidades políticas unidas a pessoas vinculadas a seitas religiosas buscando incentivar, veladamente, o início de uma guerra santa, buscando efetivar uma hegemonia de certo campo religioso, apesar do fato que a República Federativa do Brasil se constitua em Estado Democrático de Direito, donde TODOS podem professar os credos a que se vincularem, como, também, não professar nenhum deles (o que se poderia denominar ateu).

A ideia de laicização pode ser estudada a partir da experiência francesa que buscou se firmar sobre três princípios políticos, os quais foram definidos no processo histórico daquela nação. Vejamos:

1. Autonomia do político

Esse princípio preconiza que o poder não é emanação da vontade divina mas o representante de uma comunidade de cidadãos a governar-se a si própria. (No Brasil, a CF/88 estabelece que o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes, etc.).

2. Privatização inelutável do religioso.

Trata-se de um dispositivo republicano que não põe em causa a liberdade de consciência. Nesse caso, as igrejas só devem se vincular, exclusivamente, ao direito privado.

3. Primado do Estado em relação à sociedade civil.

O cidadão deve participar na elaboração de uma identidade coletiva, da qual pertença imediatamente, guiado apenas  pela força da razão.

O fato é que, na França, os monarcas se apresentavam como representantes de Deus na Terra. Portanto, possuíam, a um só tempo, poder temporal e poder espiritual. Se mostravam como pessoas sagradas. Eram chefes da igreja e, também, chefes de Estado. Até a revolução francesa de 1789, o catolicismo era a religião oficial do Estado, e não era permitindo o culto ao protestantismo reformado.

À Igreja católica romana controlava direitos individuais e coletivos da vida dos franceses, tais como: estado civil, ensino, medicina, etc. Até o calendário, as festas e as tradições populares, tudo era de inspiração católica. Basta estudar a história daquele país para verificar o quanto perniciosa foi essa promíscua relação entre Estado e Igreja. Misturar assuntos espirituais com temporais NUNCA resultou em algo útil, bom e benéfico para o povo.

A Revolução Francesa estabeleceu uma política antirreligiosa; nacionalizou os bens do clero, suprimiu ordens monásticas e os votos religiosos (os quais foram julgados contrários às liberdades contidas nos Direitos do Homem).

Mas, havia um partido clerical. Os membros do clero, eleitos, deveriam prestar juramento à Constituição Civil. Todavia, nem todos obedeceram e alguns padres recusaram-se a isso. A Igreja católica da França se dividiu em dois grupos: de um lado o clero constitucional e, do outro, o clero refratário e fora-da-lei. Dá pra imaginar que o conflito não iria acabar bem. Várias insurreições ocorreram e foram brutalmente reprimidas, uma vez que, também, havia aqueles que eram fiéis à monarquia.

Allan Kardec, falando sobre o objetivo da Doutrina Espírita, sua essência e conteúdo, em uma de suas cartas a correspondentes da Revista Espírita, mencionou o interesse que esse partido clerical teve em aprofundar o estudo do Espiritismo, pois, queriam conhecê-lo para o combater.

Interessa notar que Kardec deixa claro o objetivo da Doutrina Espírita no plano coletivo (vida em sociedade). Entre outras afirmações ensinou que a Doutrina Espírita "conduz, inevitavelmente, e por uma via segura, a todas as reformas sociais perseguidas pelos homens de progresso e que ela  acarretará, forçosamente, à ruína dos abusos". Perceba que, ao longo do processo histórico, quando o campo religioso era o detentor soberano do poder cometia atrocidades e abusos, o que não cessou quando o materialismo inimigo postulou combater o fanatismo.

Allan Kardec termina por esclarecer que "quem quer que a estude [a Doutrina Espírita] no seu princípio e nas suas consequências, nela verá toda uma revolução moral; em vez de tomar o edifício apenas pelo topo, ela o toma pela base e lhe dá sólidos alicerces no coração dos homens, inspirando-lhes a fraternidade efetiva e destruindo lhes o egoísmo, verme roedor de todas as instituições liberais que repousam apenas na materialidade".

Esperamos realmente que, ao menos entre os Espíritas, se compreenda a essência do Espiritismo e se combata a ideia de um Estado sectário. A laicidade é corolário da Lei Moral de Liberdade preconizada pelo Espiritismo. Deixamos, a seguir, para reflexão, essa notável CARTA DE ALLAN KARDEC.


Uberaba-MG, 20/10/2022.
Beto Ramos.


Fonte:

FEAL - Fundação Espírita André Luís (CDOR - Centro de Documentação de Obras Raras).

sexta-feira, 2 de setembro de 2022

PROJETO DE REGULAMENTO PARA USO DE GRUPOS E PEQUENAS SOCIEDADES ESPÍRITAS

 

Está disponível para baixar o Projeto de Regulamento de Casas, Grupos e Sociedades Espíritas disponibilizado por Allan Kardec.

Trata-se de um material que o organizador do Espírito repassou para os grupos durante sua Viagem Espírita em 1862.

Em PDF no drive, disponibilizamos para estudantes, coordenadores, diretores e presidentes de grupos que queiram atender às advertências de Kardec e regulamentar as atividades conforme o Espiritismo propõe.

Acesse e baixe agora: PROJETO DE REGULAMENTO

Uberaba-MG, 02/09/2022.
Beto Ramos.


quinta-feira, 18 de agosto de 2022

O ESPIRITISMO E A SOLUÇÃO DE PROBLEMAS DE ORDEM PSICOLÓGICA, MORAL E FILOSÓFICA.

 

"A Doutrina Espírita contém a solução de um certo número de problemas do mais alto interesse, de ordem psicológica, moral e filosófica". (O Que é o Espiritismo - Preâmbulo).


Todo aquele que estuda o espiritismo, certamente, já se deparou com essa afirmação de Allan Kardec em um de seus magistrais resumos da Doutrina Espírita. É importante sempre buscar agregar conhecimento em torno daquelas palavras, termos e frases usadas pelo organizador do Espiritismo, pois disto decorre e depende a compreensão adequada do edifício espírita.

Somente nessa frase, antes destacada, já podemos encontrar razões  suficientes para uma meditação profunda. Vamos, portanto, refletir sobre as expressões usadas: psicológica, moral e filosófica.

Nessa breve exposição procuraremos demonstrar onde, entre outras fontes da lavra do professor, estão contidos os desenvolvimentos de Kardec conforme cada campo do saber citados na frase objeto do estudo, segundo a compreensão que temos de cada um deles. Vejamos:


PSICOLOGIA

1. São os estados e processos mentais do indivíduo:

- O estado mental do Espírito, como aprendemos na Obra O Céu e o Inferno, refere-se ao estado feliz ou infeliz do Espírito, encarnado ou não;

- Esses estados em que se encontram representam o céu para o Espírito Feliz e o inferno para o Espírito Infeliz.

2. Trata do comportamento do indivíduo, como de sua interação com o ambiente físico e social:

- O comportamento do Espírito, sua interação com o mundo espiritual, como percebe e compreende esse ambiente está em conformação com sua elevação e o conhecimento adquirido; Disso decorre o modo como interage com os demais Espíritos (Escala Espírita, O Livro dos Espíritos).

Além do mais, tudo isto se reflete no mundo físico, uma vez que o Espírito reencarna, se comporta e interage com as pessoas segundo o seu caráter (União do Princípio Espiritual e da Matéria, Cap. 11, Gênese Espiritual, A Gênese).


MORAL

São as bases que guiam a conduta do Espírito, ensinando a melhor forma de agir e se comportar dentro de uma sociedade:

Em O Livro dos Espíritos encontramos qual a definição de moral dada pelos Espíritos, como o Espírito deve se comportar em relação aos semelhantes e perante Deus, bem como a própria distinção do bem e do mal (Questão 629 e seguintes).


FILOSOFIA

O Espiritismo supera o senso comum no que se refere à realidade empírica e das aparências percebidas pelos sentidos físicos:

- O Espiritismo se relaciona com o conhecimento científico avaliando os campos do saber e contribui para o desenvolvimento de muitos ramos do saber (Revistas Espíritas);

- No campo da metafísica o Espiritismo supera as meras especulações e traz respostas sobre as verdades primeiras relativas a Deus, Alma e Matéria (O Livro dos Espíritos); Enquanto usa procedimentos argumentativos, lógicos e dedutivos, relaciona teoria e prática (O Livro dos Médiuns e O Céu e o Inferno);

- O Espiritismo apresenta as consequências éticas e psicológicas advindas das relações mantidas entre os Espíritos (Definição de O Que é o Espiritismo, Preâmbulo da obra de mesmo nome);

- A razão é a condutora da fé; O procedimento do Espiritismo é o método racional, vez que não traz teoria, doutrina ou sistema preconcebido (Folha de rosto da obra O Evangelho Segundo o Espiritismo). Tudo perpassa pelo método científico da observação (O Livro dos Médiuns, Revistas Espíritas e O Céu e o Inferno).

Vários desses pontos mencionados são abordados por Allan Kardec na Obra O Que é o Espiritismo. Em O Evangelho Segundo o Espiritismo, ao apresentar a base da Autoridade da Doutrina Espírita, encontram-se as mesmas explicações ora desenvolvidas.

Como ciência-filosófica o Espiritismo superou o senso-comum e não se constituiu em sistema especulativo (O Livro dos Espíritos, O Livro dos Médiuns, O Céu e o Inferno e Revistas Espíritas). Em O Livro dos Médiuns, como na obra O Céu e o Inferno, o Espiritismo trouxe a prática e a experimentação, inclusive a comprovação da estruturação filosófica da Doutrina Espírita (O Livro dos Espíritos).

As informações aqui compartilhadas são apenas fragmentos daquilo que o leitor poderá encontrar como desenvolvimento daquela frase inicial nas obras escritas por Allan Kardec.  Também, é fato, constituem-se em nossa interpretação do conteúdo exposto para estudo na Doutrina dos Espíritos.

Então, mãos à obra. Bons estudos.

Uberaba-MG, 18/08/2022.
Beto Ramos

sexta-feira, 8 de julho de 2022

O ESPIRITISMO E A PESQUISA CIENTÍFICA.

 

Allan Kardec, pseudônimo do educador e filósofo Rivail, apresentou na obra O QUE É O ESPIRITISMO um quadro restrito de algumas das perguntas fundamentais sobre o Espiritismo e declarou: "é a primeira iniciação para aquele que deseja saber se vale a pena estudar o Espiritismo".

No preâmbulo dessa obra, de partida, esse fantástico pedagogo afirmou que o Espiritismo é uma ciência da observação e uma doutrina filosófica. E esclareceu que, enquanto ciência da observação, o Espiritismo se ocupa das relações que podem ser mantidas com os Espíritos; como filosofia, estuda as consequências morais que decorrem destas relações.

Ainda que não exista qualquer dúvida quanto aos esclarecimentos, bem como o locus epistemológico do Espiritismo na TEORIA DO CONHECIMENTO, é comum encontrar indivíduos que se declaram 'espíritas', mas incluem o Espiritismo no campo da religião, caracterizando-o como  uma seita a mais.

Esse erro induz o leigo a crer que o Espiritismo seria apenas mais uma revelação de natureza religiosa, cuja origem é divina e exige crença cega, sem hipótese de questionamentos. Sobre esse equívoco o próprio Allan Kardec tratou com clareza na obra A Gênese, capítulo 1, A Natureza da Revelação Espírita.

Por outro lado, informações inadequadas e estudos incompletos, bem como interpretações equivocadas, sem lastro que as fundamentem, leva o indivíduo a julgar que, no trabalho realizado por Allan Kardec, não houve a coerência da investigação que tem o rigor da ciência. Mas, ao contrário disto, o trabalho que culminou nas obras espíritas demonstram uma fina arte de raciocinar, onde Kardec buscou distinguir raciocínios válidos de outros não válidos, indagou, investigou, pesquisou, ligando ideias coerentes segundo as leis do raciocínio.

Kant, em 1786, declarou: "afirmo que sempre que se tenha prolongado uma disputa, especialmente no campo filosófico, havia, em suas raízes, não um simples problema de palavras, mas um problema genuíno acerca das coisas". Mais tarde, os Espíritos vão dizer a Kardec: entendei-vos quanto as palavras.

Karl Popper (2008, 16ª edição, tradução em língua portuguesa), afirma que um cientista, seja teórico ou experimental, formula enunciados ou sistemas de enunciados e verifica-os um a um. No campo das ciências empíricas, para particularizar, ele formula hipóteses ou sistemas de teorias, e submete-os a teste, confrontando-os com a experiência, através de recursos de observação e experimentação.

Percebemos que estudar, pesquisar, produzir ciência não é uma tarefa fácil e simples. Se um estudo conduzisse a uma única resposta científica, isto é, válida, para cada problema apresentado, a tarefa de separar a opinião vulgar da científica seria menos inglória. No entanto, o pesquisador encontra uma variedade de respostas válidas, o que lhe coloca numa posição difícil de julgar o que é científico e o que é vulgar. 

Porém, sabemos que, se todas as respostas forem válidas, não haverá como distinguir o científico e o vulgar. Entre outas coisas, é possível presumir que esse dilema advém da polissemia de expressões, consequências de usos ideológicos opostos e múltiplos. O papel do pesquisador será os identificar. Um dos muitos trabalhos de Kardec foi esse.

Segundo informa FIGUEIREDO (Revolução Espírita, Maat, 2016) o professor Rivail ficou diante de um fenômeno original, que merecia ser investigado. Entre outras obras desse cientista, pedagogo e filósofo, vamos encontrar O Livro dos Espíritos, contendo vários temas com uma coordenação precisa de hipóteses, cujo conteúdo forma uma teoria metafísica sólida, coerente e com encadeamento lógico exato, abrangendo todas as principais questões da ciência, da moral e da psicologia.

Qual era o fenômeno original que se apresentava diante de Rivail? Inúmeras manifestações ocorriam em todo o planeta, ao mesmo tempo, e diversos estudiosos tentavam explicá-las, como informa FIGUEIREDO na obra citada. Qual a diferença desse movimento para aqueles fenômenos que ocorriam desde a antiguidade? Tratava-se de uma diversidade de comunicações simultâneas com um padrão inteligente. Não era nenhum fato esparso ou aleatório. O que ficou evidente para aquele pesquisador é que, por trás das manifestações, havia um plano amplo e complexo. Rivail tratou de os reunir num todo coerente.

Além do mais foi possível constatar que, no mesmo período em que ocorria uma revolução científica e moral na Terra, era oferecido pela iniciativa dos Espíritos, em todo o planeta, um conhecimento que a humanidade não seria capaz de descobrir sozinha. Tratava-se do ensino dos Espíritos.

Na obra Viagem Espírita de 1862, Allan Kardec vai responder uma importante questão: "Qual foi o meu papel? Nem o de inventor, nem o de criador. Vi, observei, estudei os fatos com cuidado e perseverança; coordenei-os e lhes deduzi as consequências; eis toda a parte que me cabe; aquilo que fiz outro poderia ter feito em meu lugar; [...] será a obra da minha vida até meu último dia, porque na presença de um objetivo tão importante, todos os interesses materiais e pessoais se apagam como pontos diante do infinito".

Não podemos amesquinhar o Espiritismo com a ideia menor de que não se trata de uma ciência-filosófica como propôs Kardec no campo da Teoria do Conhecimento. Por suas obras podemos indagar sobre a magnitude do seu trabalho, bem como da posição que o Espírito que animou sua personalidade ocupa na hierarquia/escala evolutiva dos Espíritos.

Observamos na sua pesquisa que ele delimitou claramente o tema, especificou o problema de modo a saber o que pesquisar, não foi um generalista, apresentou como hipóteses soluções provisórias para os problemas, justificou o porquê de fazer a sua pesquisa, deixou claro o seu objetivo demonstrando o que queria com a mesma.

Ao que parece, Kardec usou entre os seus procedimentos e técnicas de pesquisa, a metodologia empírico-analítica. E, o que é extraordinário, não deixou de apresentar seu referencial teórico. Como exemplo deste citamos, em o Evangelho Segundo o Espiritismo, a dissertação sobre o DEVER, cuja fonte é: LÁZARO, PARIS, 1863.

Além do mais, é possível distinguir no trabalho de Kardec a presença de um conjunto de verbos que regeram e estiveram presentes durante todo o seu trabalho. Veja-se o quadro:

Conhecimento

Compreensão

Aplicação

Análise

Síntese

Avaliação

Apontar

Descrever

Aplicar

Analisar

Coordenar

Apreciar

Assinalar

Discutir

Demonstrar

Calcular

Conjugar

Aquilatar

Citar

Explicar

Empregar

Comparar

Construir

Avaliar

Definir

Expressar

Esboçar

Contrastar

Criar

Calcular

Escrever

Identificar

Ilustrar

Criticar

Enumerar

Escolher

Inscrever

Localizar

Interpretar

Debater

Esquematizar

Estimar

Marcar

Narrar

Inventariar

Diferenciar

Formular

Julgar

Relacionar

Reafirmar

Operar

Distinguir

Listar

Medir

Registrar

Revisar

Praticar

Examinar

Organizar

Selecionar

Relatar

Traduzir

Traçar

Experimentar

Planejar

Validar

Sublinhar

Transcrever

Usar

Investigar

Reunir

Valorar

Poderíamos indagar se, na organização da Doutrina dos Espíritos, Kardec deixou de lançar mão das ações representadas por cada conjunto de verbos que compõem a estrutura da sua pesquisa, uma vez que, conforme asseverou na obra Viagem Espírita, seu trabalho foi de conhecimento, compreensão, aplicação, análise, síntese e avaliação.

E você, qual sua opinião sobre a pesquisa científica realizada por Allan Kardec?

Uberaba-MG, 08/07/2022
Beto Ramos

quinta-feira, 13 de janeiro de 2022

TEORIA DE RIVAIL SOBRE VÍCIOS INATOS DA CRIANÇA

 

As observações de Rivail demonstravam que havia crianças nascidas em ótimos berços, mas que eram acompanhadas de funestas disposições. Sendo assim, haveria disposições verdadeiramente inatas, tais como:

  • Temperamento;
  • Vivacidade;
  • Lentidão;
  • Cólera;
  • Sangue-frio;
  • Agilidade;
  • Profundidade das ideias.

Força e fraqueza seria relacionadas à constituição, nascendo-se dessa ou daquela maneira. No tempo de Rivail pensava-se que a origem destas disposições estariam relacionadas com a influência do clima sobre a mãe antes do nascimento da criança, o que poderia influir nas disposições físicas e morais.

Rivail não concordava com a teoria dos vícios inatos. Pensava que tudo não passava de influência do meio, o que poderia ser alterado pela boa educação. A moral, portanto, deveria ser ensinada na infância, não na mocidade, quando muitas paixões já haviam criado raízes. 

Assim, desenvolve a teoria de que, tal como o clima físico (atmosfera), o clima moral em que uma criança é influenciada, exerce maior ou menor efeito (vício) na criança devido ao seu temperamento (inclinação).

Para Rivail, o ser humano não nasce virtuoso, nem vicioso, porém, mais ou menos disposto a receber e a conservar as impressões próprias. São essas últimas que desenvolvem vícios e virtudes. Na Revista Espírita, falando sobre Gail na Frenologia, Kardec abordará esses pontos, mas com o conhecimento do princípio espírita da reencarnação.

Quanto aos vícios e virtudes, a essência do pensamento de Rivail será validada para o Espírito criado simples e ignorante, com nulidade moral e sem qualquer conhecimento, portanto, sem vício ou virtude. Ao longo das sucessivas reencarnações vai recebendo impressões, conhecendo, formando o seu caráter, habituando-se a vícios, despojando-se e adquirindo virtudes.

Interessante notar que diante da indagação sobre a causa primeira das qualidades morais, se inatas ou adquiridas, Rivail dirá que cada um poderá ter sua opinião sobre esse assunto. Não se nega, contudo, que o segredo da verdadeira educação moral é cercar a criança desde seu nascimento, de impressões salutares para seu espírito e o seu coração, evitando as prejudiciais. E esse é o papel da educação por meio dos educadores (pais e mestres), governo e sociedade em geral.

Como fazer isso? Rivail ensina que é necessário saber perfeitamente apreciar o efeito de todas as impressões sobre as crianças e em saber dirigir as circunstâncias que podem produzi-las. Rivail define a educação como uma arte particular, distinta das outras que exige estudo especial, pois não é fácil de estudar, nem de praticar. Para ser educador é preciso ter vocação particular, disposição, paciência e sabedoria a toda prova.

A função do educador exige conhecimento profundo do coração humano e da psicologia moral, além de um conhecimento perfeito dos meios mais apropriados a desenvolver nas crianças as faculdades morais, físicas e intelectuais. Rivail adverte que não se pode confiar os filhos, levianamente, a quem não sabe o que é educação. No seu magistério, há profunda diferença entre instrução e educação, conforme se vê:


No século 19 havia um grande preconceito contra tudo que se relacionasse à educação na França, motivo pelo qual a mesma estava longe da perfeição. Já naquele tempo via-se a profissão de educador ligada à condição de humilhação.

Muitos pais menosprezavam a profissão de educador. E, cegos em relação aos filhos julgavam que se fizeram progressos era devido à sua inteligência admirável; se eram tolos, a culpa estava toda na pessoa do professor; se havia reforma nos caracteres, eles possuíam encanto natural; mas, se eram viciosos, a causa eram os professores. Além do mais, era proibido encontrar defeitos nos filhos frente aos seus pais.

Não é necessário relatar a variedade de problemas causados por tais situações. Para Rivail a felicidade humana só é assegurada pelo progresso da educação, que lhe exerce influência direta. Interessa notar que Rivail, com o pseudônimo Allan Kardec irá abordar a questão da felicidade e da infelicidade do Espírito no campo da moral.

Rivail, na sua obra, pondera sobre o papel da educação pública e a organização das instituições: se ela é viciosa, a educação será necessariamente má. Pensava assim: se todas as instituições fossem convenientemente organizadas, se todos os diretores tivessem a instrução necessária - não falo da instrução científica - mas, da apropriada a essa função, a educação não tardaria a melhorar sensivelmente.

Em alguns de seus textos, Kardec vai afirmar algo parecido sobre a educação, não aquela adquirida nos livros, mas a educação moral (Livro dos Espíritos e Evangelho Segundo o Espiritismo).

Rival ensina que a educação é o resultado do conjunto de hábitos adquiridos, os quais resultam de impressões que os provocam. O direcionamento dessas impressões depende unicamente do papel dos pais e dos educadores. Uma boa educação resulta de bons educadores.

No seu magistério afirma que se falarmos à inteligência e não somente à memória, o espírito adquire o hábito da reflexão e da observação; ele sabe pensar e leva este hábito a toda parte. Não é sobrecarregando a memória com palavras que se desenvolve a inteligência na criança desde cedo, mas enriquecendo a sua imaginação com ideias justas.

Rivail conforma-se a Rousseau e a Pestalozzi que defendem o ensino com conteúdo, vivido e experimentado, em detrimento daquele somente palavroso. Além do mais, constata que o sistema de castigo e recompensa é um inconveniente do ensino comum no campo da educação moral, pois usa-se castigo como punição e recompensa com isca ou atração. Nada disso contribui para satisfazer a imaginação dos jovens. O sistema é usado para encher à força a cabeça dos estudantes com palavras vazias.

Interessa notar que Kardec, tratando da Lei de Igualdade, receberá respostas dos Espíritos sobre o papel da sociedade na educação. Temos que tais ensinos coadunam com as ideias centrais do plano de educação proposto por Rivail. Trata-se do uso da educação como um instrumento para que a sociedade possa cumprir o seu papel.

Na proposta de Rivail ele conclui que um plano de instrução, que oferecesse maior variedade e maior satisfação, apresentaria entre outras vantagens, a de contribuir essencialmente ao sucesso da educação moral, fornecendo ao espírito os elementos de ocupações úteis e agradáveis. É a mesma resposta que Allan Kardec irá receber dos Espíritos Superiores nas questões 812 a 813 de O Livro dos Espíritos. 

Rivail tecerá longas considerações no seu trabalho referente ao assunto das ocupações de cada indivíduo.

Com certeza, o que compartilhamos nesse espaço ainda é muito pouco diante da grandeza desse grande homem que foi...

KARDEC, MAS ANTES DE TUDO, RIVAIL, O EDUCADOR.

Uberaba-MG, 12/01/2021
Beto Ramos


FONTE BIBLIOGRÁFICA:

FIGUEIREDO, Paulo Henrique. Revolução Espírita - a teoria esquecida de Allan Kardec. São Paulo: Maat, 2016.

INCONTRI, Dora; GRZYBOWSKI, Przemyslaw. Kardec Educador - Textos Pedagógicos de Hippolyte Léon Denizard Rivail. São Paulo: Editora Comenius (e-book).

quarta-feira, 3 de novembro de 2021

A HISTÓRIA RECUPERADA DO ESPIRITISMO

 

Se pesquisarmos entre os espíritas quanto à origem da Doutrina Espírita, certamente, a maioria responderá que provém do ensinamento dos Espíritos superiores. Não é possível negar-se a idoneidade da informação quando encontramos a afirmação de Kardec quanto a O Livro dos Espíritos constituir-se em compêndio de seus ensinamentos que, escrito por ordem e sob ditado daqueles, estabelecem os fundamentos de um filosofia racional, contendo a expressão de seu pensamento e sofrido o seu controle.

Mas, seria lícito afirmar que tudo provém dessa única fonte? Na mesma obra citada, percebe-se o uso da expressão filosofia espiritualista logo na sua contracapa. Além de constar na introdução ao estudo da doutrina espírita que:

"Como especialidade "O Livro dos Espíritos" contém a Doutrina Espírita; como generalidade liga-se ao Espiritualismo, do qual apresenta uma das fases. Essa a razão porque traz sobre o título as palavras: Filosofia Espiritualista".

Se o Espiritismo é uma das fases do Espiritualismo, ao qual é ligado, como empreender o estudo do Espiritismo com parcial ou total desconhecimento do Espiritualismo? Eis aqui o equívoco que cometemos há muito tempo. Esse tempo de ignorância precisa ficar no passado e constar somente nos arquivos e anais da história do Espiritismo. Quanto a nós, vamos buscar contribuir para iluminar o debate.

O pesquisador Paulo Henrique de Figueiredo vem desempenhando importante papel no resgate da teoria moral espírita. Do seu AUTONOMIA: A HISTÓRIA JAMAIS CONTADA DO ESPIRITISMO, vamos extrair preciosas informações para contribuir com o retorno das águas do Espiritismo ao seu curso natural.

É preciso remontar ao ambiente francês criado pelo iluminismo que prepara ideias revolucionárias, de onde surge o rompimento radical com as teorias da igreja com o aparecimento das ideias materialistas que, mesmo com a tentativa de retorno ao regime antigo, um grupo denominado ideólogos passaram a determinar a produção do conhecimento universitário e conduziram o pensamento filosófico para o campo do ceticismo materialista.

Como os materialistas explicariam a existência humana?

Investigando o fenômeno do comportamento humano por meio de análises psicológicas das faculdades humanas, estudando a linguagem, o juízo e a vontade, perceberemos que na busca da origem e a extensão do conhecimento humano surge a ideologia como ciência. A princípio, investigando o ato de pensar, teorizou-se que estaria associado ao juízo, como um sentir que há relação entre as coisas, com o desejo, como um sentir que quer algo, e com a sensação, com um sentir algo atual e presente por meio dos órgãos. Concluindo, desse modo, que sentir é o mesmo que existir.

Para tanto, envolveria a solução denominada motilidade, importando em sentir a diferença entre o "objeto externo" e "si mesmo". A formação da personalidade humana resultaria de uma cadeia de ideias no conhecimento das coisas. O indivíduo, zerado no nascimento, tornaria pensante pelos hábitos que se condicionou pela repetição.

Percebemos aí a inexistência do senso moral e a desnecessidade de fazer o bem aos outros sem limites.

Por fim, o ser humano estaria em busca da satisfação de seus desejos, movido apenas pelo instinto de preservação, comandado pela dor e pelo prazer. Nesta escola de pensamento a educação forma personalidade e comportamento por meio de punição e recompensa, no interesse da sociedade.

Mas, não podemos perder de vistas: estamos no campo do pensamento científico.

Não havia motivos, até então, para que se fizesse oposição a argumentos lógicos e razoáveis. No entanto, surgirá uma crise. É nesse momento que há mudança de paradigmas, pois, a teoria que parecia estar completa apresenta-se equivocada, uma vez que não explica fenômenos que fazem parte do seu objeto de estudo. A mudança de paradigma é resumida assim por FIGUEIREDO: "[...] a ciência do homem após a Revolução Francesa evoluiu de um corpo que pensa porque sente, para uma alma que pensa usando o corpo como seu instrumento". (grifo nosso).

Segundo FIGUEIREDO, Maine de Biran (1766-1824), questionará a teoria da motilidade, pois, desafiado pelo Instuto da França (1802) a responder qual a influência do hábito sobre a faculdade de pensar?, partindo da hipótese materialista, reconhece na fisiologia os intrumentos da sensibilidade, mas vendo o ser humano como alma e corpo, reconhecerá que as faculdades são da alma e não do corpo. Esse pensador conceituará o ser humano como duplo, ativo e livre. Para Biran o ser humano é uma alma encarnada.

Nesse reduzidíssimo resumo, sem qualquer ideia de esgotar, mas, na esperança de impulsionar a investigação da ciência, pode-se perceber que há toda uma psicologia precursora do Espiritismo. Não podemos estudar o Espiritismo com a visão de nosso tempo.

É preciso contextualizá-lo no período que antencedeu e mesmo durante o século 19. Várias ideias antes elaboradas e muitos conceitos fundamentais que já estavam desenvolvidos foram tomados como base por Allan Kardec.

Se buscarmos estudar a ciência filosófico-espírita vamos encontrar todo um mundo desvendado por Kardec. O mundo das consequências morais, a partir do reconhecimento do Espírito como a "alma desencarnada".

O método da observação, ao seu turno, também não é orginal do Espiritismo, mas foi por ele que Kardec passou à observação dos fenômenos espíritas.

Em breve faremos novas incursões e traremos mais informações relevantes, principalmente o fato de que jovens e adultos estudavam o Espiritualismo Racional como currículo escolar na França do século 19.

FONTE: FIGUEIREDO, Paulo Henrique de. Autonomia: a história jamais contada do espiritismo. São Paulo: FEAL, 2019.

Uberaba-MG, 03/11/2021.
Beto Ramos

DESTAQUE DA SEMANA

A DOUTRINA DOS ESPÍRITOS NÃO É ASSUNTO QUE SE ESGOTA EM UMA PALESTRA

  EM SUAS VIAGENS KARDEC MINISTRAVA ENSINOS COMPLEMENTARES AOS QUE JÁ POSSUIAM CONHECIMENTO E ESTUDO PRÉVIO. Visitando a cidade Rochefort, n...